quarta-feira, 2 de março de 2011

As mulheres nuas dos outros

Mulheres dos outros" é o nome de uma exposição em São Paulo que traz a público, em tamanho ampliado, imagens de mulheres anônimas nuas tiradas na década de 50
LAURA LOPES
eduardo muylaert
Uma das imagens encontradas por Eduardo Muylaert: riscos e sujeiras do tempo são incorporados

Uma caixa com 100 slides antigos, quase jogada às traças em uma barraquinha da feira de objetos antigos no vão do Masp (Museu de Arte de São Paulo), se transformou em uma exposição tão delicada quanto sensual. Há alguns anos,Eduardo Muylaert, que se diz "catador de coisa velha, um reciclador", comprou os slides a R$ 100. Por fora, um escrito indicava o que ele encontraria dentro, "nus artísticos". Ao abrir, percebeu que teria um ótimo material para fazer o que mais gosta: fotografia.

Advogado de formação e profissão, Muylaert já não sabe mais se a fotografia virou profissão ou se ainda é hobby – uma vez que o pratica há quase 20 anos. Na dúvida entre a vida solene do Direito e a passional da arte, continua fotografando e expondo. A última individual havia sido em 2006, na Pincoteca do Estado, de fotos em preto e branco. "Boa Noite, Paulicéia" exibiu fotos escuras, quase abstratas, da capital paulista. Agora, no meio de fevereiro, ele inaugurou a exposição "Mulheres dos outros", na Fauna Galeria, também em São Paulo.

Pelo tipo e marca de filme, e pela iconografia das imagens adquiridas na feirinha, Muylaert percebeu que se tratava de nus da década de 50. Seus autores eram, segundo ele, "fotógrafos anônimos e mal pagos de produções baratas em série, retratando mulheres nuas e mal pagas, de modo a despertar a imaginação, mas não a ira da censura". Alguns slides originais chegam a ser grotescos, na opinião do fotógrafo, e com apelos de época que não fazem sentido hoje (uma mulher com seios gigantes, ou outra, com chapéu holandês carregando latas de leite sobre os ombros). Por isso, ao trabalhar as imagens, ele fez recortes: além de tirar rostos e cabeças, escolheu os detalhes mais belos – que emprestou às fotos outro tipo de sensualidade que não a original.

Muylaert se apropria do trabalho daqueles fotógrafos e recria em cima dele – o que se vê no nome da exposição. "Se o meu trabalho tem originalidade, as mulheres dos outros agora são minhas, sem falso pudor", diz. Ele mistura conceitos de pin-up, da exploração do corpo da mulher nas revistas dos anos 50 e dá às fotos, quase pornográficas à época quando foram tiradas, a beleza clássica das esculturas gregas, valorizadas pelas marcas do tempo. Sim, porque ele fez questão de manter sujeiras, marcas, riscos e bolor que os slides ganharam ao longo das décadas. Depois de escaneá-los em altíssima resolução, trabalhou as imagens digitais no Photoshop a fim de revelar cores e detalhes. Foi assim que a sujeira foi "incorporada".

Junto às 20 ampliações há quatro fotos, tiradas em janeiro, de estátuas greco-romanas expostas no Louvre, em Paris. Além disso, o visitante poderá conferir, em um slide show, as imagens orginais do material antes de receber o devido tratamento. A exposição vai até dia 15 de março, na Fauna Galeria. Confira, abaixo, algumas fotos.


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